EXPOSIÇÃO DE FRANCISCO RUIZ ferrándis na sociedade nacional de belas artes, lisboa (20.11.1948-30.11.1948)
A exposição de Francisco Ruiz Ferrándis em Lisboa, que foi uma iniciativa do Instituto Espanhol de Lisboa[1], realizou-se entre os dias 20 e 30 de Novembro de 1948 na Sociedade Nacional de Belas Artes. Na inauguração, estiveram presentes Rafael Fornes (Ministro de Espanha), Eugenio Montes (diretor do Instituto Espanhol), Luís La Barra (correspondente do jornal Arriba!), Guilherme Pereira de Carvalho (representante de António Ferro e do Secretariado Nacional de Informação) e “muitos artistas portugueses” e “críticos de arte”[2].
Catálogo[3] composto por:
- “Originais”: Eucaliptos (n.1); Entardecer no Campo (n.2); De Regresso ao Lar (n.3); Fiandeiras Maiorquinas (n.4); Pax in Anima (n.5); Ciganinha Cesteira (n.6); Cavaleiros no Deserto (n.7); Depois da Chuva (n.8); A hora da Referição na Granja (n.9); Velhos de Lagartera (n.10); Carro de bois Castelhano (n.11); Sol da tarde (Cuenca) (n.12); Rio Carrión (Palencia) (n.13); Jardim de Lindaraja (n.14); Luar (San Sebastián) (n.15); Contra Luz do Monte Ulia (San Sebastián) (n.16); Mar Revôlto (San Sebastián) (n.17); Colheita do Feno (n.18); Rua de Fuentelviejo (Guadalajara) (n.19); Poesia no Campo (n.20); Côro de Aldeia (n.21); Lagarteranas na Missa (n.22); Ponte de S. Martín (Toledo) (n.23); Outono (n.24); Paisagem (n.25, n.26); Cessou a Chuva (n.27); Cuenca (n.28); Igreja da Aldeia (n.29); Cala de S. Vicente (Mallorca) (n.30); Jarra com Rosas (n.31, n.32); Tulipas (n.33); Rosas (n.34); Flores (n.35); Rosas de Chá (n.36); Crisantemos (n.37); Flores (n.38, n.39, n.40); Moleirinha Adormecida (n.41);
- “Reproduções”: A Vigairia (Fortuny) (n.42); Judith (Cristófano Allori) (n.43); A Ronda de Noite (Rembrandt) (n.44); A Rendição de Breda (Velázquez) (n.45); Leitura Proibida (Karel Ooms) (n.46); Uma Refeição acanhada (Herring) (n.47); Ferraria Moura (Fortuny) (n.48); A Lição de Pintura (D’Arena Pietro) (n.49); A Lição de Poesia (A. Simonetti) (n.50); Barraca Valenciana (J. Benlliure) (n.51); Ainda dizem que o peixe é caro (Sorolla) (n.52); Jantar no Bosque (Watteau) (n.53); D. Joana a Louca (Pradilla) (n.54); Presente de Boda (C. Vázquez) (n.55); Café Mouro em Túnez (J. Benlliure) (n.56); Uma Jugada difícil (não refere o autor) (n.57); Ninfas perseguidas por sátiros (Rubens) (n.58); O Pintor Colecionista (Meissonier) (n.59); As Meninas (Velázquez) (n.60); O Sonho de Jacob (Ribera) (n.61); Maja vestida (Goya) (n.62); Maja nua (Goya) (n.63); Um espia no acampamento (Seymour Lucas) (n.64); O estampido (W. R. Leig) (n.65); O Velho moinho (Patrick Nasmyth) (n.66); O Moinho (Meindart Hobema) (n.67); O Primeiro Desgosto (De un gravado. Colorido original) (n.68); O Triunfo de David (Matteo Roselli) (n.69); A Noiva Judia (Rembrandt) (n.70); Família no Jardim (Jacob Jordaens) (n.71); Festa malograda (E. Melida) (n.72); Um Teatro de Robertos na Festa de Maio (B. R. Haydon) (n.73); Aqui ha erro n’alguma parte (Charles Green) (n.74); O Homen do Capacete de Ouro (Rembrandt) (n.75); O Alegre bebedor (Franz Hals) (n.76); Em casa dos Duques (J. Alvarez) (n.77); Invação dos Barbaros (U. Checa) (n.78); Despojos de Guerra (J. Gallego) (n.79); Banquete de Sancho Panza (Moreno Carbonero) (n.80); A Rendição de Granada (Pradilla) (n.81).
Vários periódicos lisboetas - como o Diário de Lisboa, o Diário de Notícias[4], o Novidades[5], O Século -, referiram esta exposição na Sociedade Nacional de Belas Artes. No Diário de Lisboa[6], exaltou-se “o virtuosismo da mão” e a “pupila penetrante, espécie de célula fotoelétrica registadora de imagens” deste pintor, “subtil” e “delicado miniaturista do óleo”, que produz uma arte que “não se suponha que seja (...) fácil”. As telas, “de um decímetro de altura, por meio, se tanto, de comprimento” abrangem originais do pintor e cópias de “quadros célebres” o que, para o autor do artigo, permite “avaliar o talento do pintor, tão conhecidos são os modelos”. No entanto, lamenta que o pintor “não aproveite melhor o seu talento”, dado que é um “pintor original”, e destaca as obras Eucaliptos (n.1), Cavaleiros no Deserto (n.7), Velhos de Lagartera (n.10) e Cessou a Chuva (n.27), que “documental a fina sensibilidade de colorista, a delicadeza dos seus pincéis e a correção do seu desenho”.
Pelo contrário, para Fernando Pamplona, colaborador nas páginas do Diário da Manhã[7], o pintor espanhol, embora “de segura técnica e apurada sensibilidade”, não revela nas suas obras “uma personalidade em extremo vigorosa nem vincadamente original”, porque “se apaga de maneira humilde ante os assuntos que escolheu e prefere sobrepor o objetivo ao subjetivo. Daí o decorativismo que caracteriza os seus pequenos óleos (...)”. Segundo o crítico, o pintor “não procura assombrar-nos com malabarismos de expressão”, contentando-se com a representação das imagens do mundo exterior “tais como as vê e como as sente”. Ainda assim, a “feição miniatural” do seu trabalho, pelo nível “de meticulosidade e de paciência” que exige, “para alcançar a limpidez e a perfeição do toque em reduzidas superfícies”, só deve aumentar o interesse do observador. É, portanto, de louvar “a mestria do artista neste género difícil e ingrato”.
Em relação às obras originais de Ruiz Ferrándis, Fernando Pamplona salienta as paisagens “às vezes, de suave bucolismo”, como Rui Carrión (Palencia) (n.13), Outono (n.24), “um tanto melancólico na semi-nudez das árvores e nos tons de oiro quente dos restos de folhagem”, Colheita do feno (n.18), que “tem excelentes pormenores cromáticos”, Eucaliptos (n.1), por oferecer “uma visão grandiosa da natureza na penumbra da mata fechada e na majestade dos caules gigantescos que avultam no primeiro plano” e, por último, Ponte de S. Martin (Toledo) (n.23), que “proporciona-nos um surpreendente efeito de luz no cenário pitoresco das ruelas toledanas”.
De acordo com Pamplona, menos feliz e menos convincente seria o tratamento da figura humana, e o crítico salienta as exceções encontradas em Fiandeiras Maiorquinas (n.4), que agrada “pela finura interpretativa e pelo frescos da tonalidade”, Cavaleiros no deserto (n.7), de “vivo cromatismo em sua ambiência oriental”, e Cala de S. Vicente (Maiorca) (n.30), que tem “tintas na verdade preciosas”. Para o crítico, o “género” em que Ruiz Ferrándis atinge “talvez maior requinte” é a sua pintura de flores, “feita em toques subtis e com rara delicadeza de tonalidades”, obra que lhe mereceu “rasgados elogios” do “crítico da envergadura do Marquês de Lozoya” que, cita-o, emparelhou o pintor com “os melhores mestres do século XVIII”. Neste género, Pamplona destaca Rosas (n.34), Jarra com rosas (n.31 ou n.32) e Crisantemos (n.37).
Em relação às suas reproduções miniaturais de obras célebres, Pamplona distingue “trabalhos de bom quilate” de “outros que não conseguem refletir o esplendor das obras originais”. Entre os melhores, destaca O Homen do Capacete de Ouro (n.75), de Rembrandt, pelos seus “contrastes bem marcados e (...) efeito espantoso”, O moinho (n.67), de Hobema, “trespassando de doçura bucólica”, Jantar no bosque (n.53) de Watteau, “cheio de graça amável e aristocrática”, O Pintor Colecionista (n.59), de Meissonier, com o seu “interior bem reproduzido (...) na sua fina notação dos pormenores e do ambiente, em que há ressaibos de arte holandesa da grande época”, Ninfas perseguidas por sátiros (n.58), de Rubens, “em que a miniatura consegue reproduzir a capricho a beleza das carnações”, A rendição de Granada (n.81), por Pradilla, “cena espectaculosa (sic) de tapeçaria em que há fulgurações de cor”, Leitura proibida (n.46), de Karel Ooms, que é um “dueto expressivo em seu dramatismo”, Café Mouro em Túnez (n.56), de J. Benlliure, “de justeza de ambiente e forte caráter” e, por último, A vigairia (n.42), de Fortuny, “de saboroso cromatismo”.
Já as reproduções de Velázquez (A Rendição de Breda, n.45, e As Meninas, n.60), de Goya (Maja vestida, n.62, e Maja nua, n.63) e de Sorolla (Ainda dizem que o peixe é caro, n.52) agradam menos o crítico, embora, conceda que nestas reproduções o pintor atinge “uma dignidade invulgar, aproximando-nos dos originais”: “Tarefa embora humilde, ela pode contudo alcançar elevado nível e exigir uma total renúncia, tanto mais de louvar neste expositor quanto é certo que não está condenado à condição de copista, pois também sabe pintar originais por sua conta e risco”.
N'O Século[8], esta "curiosíssima exposição de miniaturas a óleo, de que é autor Ruiz Ferrándis", é descrita como um evento original, dado que o "género (da miniatura) não é muito vulgar nas nossas galerias", o que por si só deveria valorizar o certame e aliciar o público a visitá-lo:
Ruiz Ferrándis é um pintor à maneira clássica, de minúcia e de pormenor, mesmo quando o atraem largas paisagens, que gosta de ver reduzidas nas dimensões mínimas de uma quadrinho que apetece comprar. Há, sem dúvida, uma tendência decorativa na sua pintura, já de si denunciada no gosto pela miniatura. De qualquer maneira, porém, os seus quadros interessam sempre e trazem a quase novidade de um estilo.
[1]Anónimo, «Ruiz Ferrandis, pintor espanhol, expõe nas Belas Artes», O Século, 21 de Novembro de 1948.
[2] Anónimo, «Ruiz Ferrandis, pintor espanhol, expõe nas Belas Artes», O Século, 21 de Novembro de 1948, 4.
[3] Sociedade Nacional de Belas Artes, Ruiz Fernandis: Exposição de óleos em miniatura (Lisboa: S.N.B.A., 1948).
[4] Anónimo, «Oleos em miniatura, de Ruiz Ferrandis», Diário de Notícias, 21 de Novembro de 1948.
[5] Anónimo, «Ruiz Ferrandis expõe óleos em miniatura na Sociedade Nacional de Belas Artes», Novidades, 21 de Novembro de 1948,
[6]Anónimo, «Exposição de Ruiz Ferrandis», Diário de Lisboa, 22 de Novembro de 1948, 2. O artigo não está assinado, mas no catálogo da exposição é reproduzida uma secção do mesmo e é atribuído a Artur Portela.
[7]Fernando de Pamplona, «Miniaturas de Francisco Ruiz Ferrandis», Diário da Manhã, 23 de Novembro de 1948, 3.
[8]Anónimo, «Ruiz Ferrandis, pintor espanhol, expõe nas Belas Artes».