EXPOSIÇÃO DE ARTE GALEGA NO PORTO, NÃO CONCRETIZADA (1935)
Em 1935, “num período de apaziguamento entre a República espanhola que virara à direita depois das eleições de Novembro de 1933 (...) e o Estado Novo português em que Salazar se sentia seguro no poder (...)”[1], realizou-se a Semana Cultural Galega, um evento que "reuniu no Porto a elite dos investigadores pertencentes ao Seminário de Estudos Galegos e à Universidade de Santiago de Compostela com os seus pares da Universidade do Porto e de outras instituições culturais de as terras Entre-Douro-e-Minho, empenhados na produção conjunta de conhecimento multidisciplinar sobre as terras do Noroeste (...), no quadro do nacionalismo galego e da desejada fraternidade solidária com o Norte de Portugal"[2].
No início de Setembro de 1934, foi anunciado nos periódicos portugueses a realização de uma grande exposição de artistas galegos no Salão Silva Porto, a realizar-se no seguinte mês de Outubro. Desde Março de 1934 que se preparava a exposição de arte galega, pensada para decorrer em simultâneo às outras atividades da Semana Cultural Galega (conferências, concertos, passeios), estando presentes no comité organizador da exposição Pedro Vitorino, Vasco Valente, Alberto Silva e Dominguez Alvarez. O comité galego da Semana Cultural Galega estava sediado em Azabachería, Santiago de Compostela. A comissão portuguesa, alicerçada na Universidade do Porto, contava com Joaquim Pires de Lima (docente da Faculdade de Medicina), Mendes Correa (docente da Faculdade de Ciências), Joaquim Lopes (docente da Faculdade de Belas Artes) e Angel Vasquez Henriques (galego residente no Porto e proprietário do Hotel do Porto), sendo secretário Joaquim Rodrigues dos Santos Júnior (docente da Faculdade de Ciências).
A 18 de Novembro de 1934, Aarão de Lacerda, através d'O Comércio do Porto, refere a intenção de abrir a exposição de arte nesse mesmo ano, sendo o certame comissariado por Dominguez Alvarez e Folgar Lema. Nesse mesmo número de O Comércio do Porto, Santos Júnior "relembra que a cidade se preparava para receber uma notável embaixada de intelectuais e artistas galegos, para a exposição de arte, o ciclo de conferências e as atuações musicais”[3]. No entanto, “o atraso nos preparativos e a sublevação de Outubro 1934 em Espanha obrigaram a adiar novamente esta tão desejada realização” para a primavera seguinte.
A convocatória para a apresentação de trabalhos e o regulamento da Exposicion de Arte Gallego foram publicados em conjunto na imprensa espanhola em Dezembro de 1934, onde se informou o leitor que o evento seria inaugurado a 15 de Março de 1935, permanecendo aberto durante trinta dias e exibindo pintura, escultura, arquitetura, gravura e artes decorativas, como “repujado, azabaches, esmaltes, cerámica y tallas en madera”. É de destacar que o documento – assinado por M. Tito Vázquez, Francisco Asorey, Juan Luís López, Manuel Miranda, Elvira Santiso, Francisco del Rio e Antonio Folgar Lema – estabelecia a participação exclusiva dos artistas galegos ou residentes na região que tivessem sido previamente convidados:
En el deseo de sus organizadores está que esta Exposicion no sea una más en la cual se busque un efecto de conjunto, no; vamos a presentarnos ante un Pueblo que está en posesión de excepcional cultura e inteligencia y que espera con curiosidad analítica la prueba del renacer de nuestro Arte, y, acaso más, ve en el horizonte la aurora luminosa de una escuela nítidamente Gallega; por ello, velando por el propio triunfo, hemos de recomendarnos la más escrupulosa selección, que nuestros artistas, más interesados que nadie, por autoestimación, han de ser los primeros en llevar a cabo enviando cada uno aquellas de sus obras en que se manifiesten a mayor altura (...).
No dia 21 de Março, o Diário de Lisboa[4] anuncia que estaria “para muito breve a grandiosa exposição de Arte galega, acontecimento inédito na vida artística do Porto”, e lista os nomes dos artistas cujas obras estariam presentes: “os grandes retratistas" Fernando Álvarez de Sotomayor y Zaragoza e Mariano Tito Vazquez, Roberto Gonzalez del Blanco, Juan Luis López García, Amando Suárez Couto, Carlos Maside, Xesús Rodríguez Corredoira, Alfredo Souto y Cuero, Manuel Colmeiro Guimarás, Laxeiro (José Otero Abeledo), Landin, Arturo Souto, Seváne, Manuel López Garabal, Francisco Llorens, Imeldo Corral González, Antonio Folgar Lema, José Dominguez Alvarez, José Seijo Rubio, Felipe Bello Piñeiro, Manuel Abelenda, Angel Robles, A. Fernandez (Antonio Fernández Gómez?), Ramon Torrádo, María Corredoyra, Elvira Santiso, Lolita Díaz Baliño, Carlos Sobrino, Antonio Insua, Torres (Manuel Torres?), Lino José Martínez Villafínez, e os escultores Francisco Asorey y González, Compostela (Francisco Vázquez Díaz), Santiago Bonome Rodríguez, Del Rio, Liste, José Nuñez, Hermanos Hernandez, e Eirva Barral, "este último, considerado o maior da Europa”.
A Semana Cultural Galega decorreu entre 30 de Março e 7 de Abril de 1935. No final de Março de 1935, a Câmara do Porto tinha alugado um espaço para a exposição de arte, e estava preparada a tramitação das obras de arte na alfândega. No entanto, a “falta de verba e pouca recetividade dos artistas galegos de maior craveira” fizeram com que a exposição não se realizasse. Das quinze conferências realizadas no âmbito da Semana Cultural Galega, apenas uma se debruçou sobre arte contemporânea: Arte galego contemporáneo (ou A nova arte galega) de Francisco Fernández del Riego.
No final de 1935, o Seminário de Estudos Galegos discutiu a organização de uma Semana Portuguesa na Galiza, que ficou prevista para 1937. "Porém, a história construiu-se de outra forma, em Fevereiro de 1936 a Frente Popular ganha as eleições e a sublevação militar de direita não se fez esperar, em Julho está em movimento. Seguem-se trágicos anos de guerra. Fechou o tempo dos projetos culturais comuns consolidados pela amizade e guiados pela chama do nacionalismo, que regressarão transformados no pós-guerra (...)”[5].
[1] O desejo de concretizar esta iniciativa foi sendo expresso por intelectuais portugueses e galegos durante vários anos. Sobre os detalhes do programa, a história, as tribulações e os inúmeros adiamentos da organização do evento, ver o artigo de Teresa Soeiro, «Galiza no Porto: evocação da Semana Cultural Galega de 1935», Portvgalia, Nova Série, 37 (2016): 89-129.
[2] Soeiro, 89.
[3] Soeiro, 99.
[4] Anónimo, «A exposição de arte galega que vai realizar-se no Porto», Diário de Lisboa, 21 de março de 1935, 2 edição.
[5] Soeiro, «Galiza no Porto: evocação da Semana Cultural Galega de 1935», 108.