II SALÃO DOS HUMORISTAS PORTUGUESES, LISBOA (6.1913)
Obras de Castañé expostas (preços em escudos): A valsa do desejo (n.90, 50$); Marroquinos (n.91, 10$); Sorriso (n.92, 10$); O riso (n.93, 15$); Brazileira (n.94, 8$); Resignação (n.95, 10$); Acanhamento (n.96, 5$); Amor (n.97, 5$); O cego e a luz (n.98, 10$); Resposta de médico (n.99, 10$); Ressurreição (n.100, 20$); Fumadora (n.101, 10$); Elixir de amor (n.102, 5$); Um impossível (n.103, 10$); Diálogo íntimo (n.104, 8$); No República (n.105, 10$); As tres graças (n.106, 5$) e Mulheres portuguêsas (n.107, 20$).
Antonio Cobeira, nas páginas da revista O Ocidente, afirmou não poder ser “mais bela, nem mais completa” a “revelação de Arte” trazida com o segundo salão dos Humoristas portugueses: “Quão distantes vamos da tenda de campanha de Mestre Bordalo... (...) Os traços caricaturais que eram ontem prosa chalra e galhofeira, são hoje desenhos melódicos, surdinas de arcos, palhetas evocando as harmonias da distância. (...) Dantes, a caricatura visava diretamente o grosso público alvar por motivos e intuitos. (...) Fazia lembrar o garotinho gavroche, de carinha suja (...), que, surpreso da magia do seu carvão, ia desenhando pelas paredes, num divertimento que se não sente e se não cansa, os episódios cómicos da rua. (...) Hoje, quase desconhecemos esse garoto. Tornou-se um rapaz de bom tom. (...) Cultiva o deboche e a neurastenia. (...) Paira num infinito de ambição”[1].
O Grupo dos Humoristas Portugueses era presidido por Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro, tendo como secretários M. Cardoso Martha e Carlos Simões, como tesoureiro Francisco Valença e como vogais Alfredo Cândido, Cândido Silva e Cristiano Cruz[2]. Elogiados Jorge Barradas, Almada Negreiros, Hipólito Collomb, Cristiano Cruz, Stuart de Carvalhais, Cobeira apontou a “atitude vigorosa e bizarra” de Adolfo Castañé como a característica que o distinguiu nesta exposição:
O seu quadro – A valsa do Desejo – é duma sensualidade forte, arrebatadora, estonteante. A – Saudade – toca as raias do desalento e desespero mudo. O – Cego e a Luz – projeta efeito intenso e embargante. O relevo do quadro é dado, não por tonalidade, mas por linhas cruas e profundamente vincadas. Não se imagine, porém, que Adolfo Castañé não sabe despir um corpo lindo de mulher. A sua compleição, quase bárbara, sabe dulcificar-se, por vezes, até ao carinho mais terno e exaltar-se no misticismo mais puro[3].
No catálogo da exposição encontramos uma breve biografia do artista, onde se menciona que “veio muito novo para Lisboa, matriculando-se no Liceu, assim como no então Real Instituto e no Conservatório”, e que “teve por mestre Emílio Ordoñéz, pintor que ainda viv(ia) em Lisboa recolhido a um obstinado isolamento”. Além disso, o leitor do catálogo é informado da colaboração de Castañé em vários periódicos portugueses, como o Pim pam pum!: Suplemento infantil do jornal O Século, A Lucta, A República, O Povo, Os Serões e a Ilustração Portuguesa. É referida a morada do artista como sendo na Rua da Glória, 73, Lisboa. Uma outra fonte associa Adolfo Castañé ao periódico Topa Tudo e refere a sua aprendizagem com Jorge Colaço[4].
A presença de Rodríguez Castañé no círculo da vanguarda artística portuguesa é ainda comprovada pela dedicatória que Mário de Sá-Carneiro lhe deixou numa cópia do seu livro A Confissão de Lucio (1914), propriedade da Leiloeira de Serralves. Na folha do anterrosto do livro, lê-se “Ao seu muito amigo Adolfo Castañé – ao primoroso artista de quem este livro perdeu uma admirável ilustração // of // Com um grande abraço de apreço, simpatia e gratidão // em 14 de Novembro de 1913 // Mário de Sá-carneiro”. Na biografia de Rodríguez Castañé, a Leiloeira de Serralves refere ser do pintor espanhol a autoria do retrato de Fernando Pessoa realizado em 1912, hoje na Casa Fernando Pessoa, Lisboa[5]. O mesmo retrato é reproduzido na obra Poemas inéditos destinados ao n.3 do "Orpheu" (1953) de Fernando Pessoa e Adolfo Casais Monteiro, que confirma essa atribuição[6].
[1] Antonio Cobeira, «Cronica Occidental», O Ocidente: revista ilustrada de Portugal e do estrangeiro, 20 de junho de 1913, 174.
[2] André Brun, Salão dos Humoristas portuguêses: catálogo da segunda exposição de caricaturas (Lisboa: Tipografia do Comercio, 1913).
[3] Cobeira, «Cronica Occidental», 175.
[4] João Paulo Paiva Boléo e Carlos Bandeiras Pinheiro, A banda desenhada portuguesa 1914-1945: catálogo (Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997).
[5] Leiloeira de Serralves, «Sá-Carneiro (Mário de) - A Confissão de Lúcio», Leiloeira de Serralves, 2019, https://serralvesantiguidades.com/lote/sa-carneiro-mario-de-a-confissao-de-lucio.
[6] Fernando Pessoa e Adolfo Casais Monteiro, Poemas Inéditos: destinados ao no3 do «Orpheu» (Lisboa: Inquérito, 1953), s.p.